O HOMEM FOI ENGOLIDO PELA TECNOLOGIA, E
TORNOU-SE VIRTUAL
“Foi dito antes que todo ser humano, como o
ponto singular de um holograma, contém o cosmo em si.(…) Contém a multiplicidade
interior, as personalidades virtuais, uma infinidade de personalidade
quiméricos, uma poliexistência no real e no imaginário, o sono e a vigília, a
obediência e a transgressão, o ostensivo e o secreto,(…) Cada um contém galáxias
de sonhos e de fantasias, impulsos indomáveis de desejos e de amores, abismos de
infelicidade,(…) Cada um contém uma solidão inacreditável, uma pluralidade
extraordinária, um cosmo insondável. (Edgar Morin- p. 94)
A questão do sujeito passa em primeiro lugar
pela sua questão de ser humano, de sua natureza inerente do ser ‘eu’. O sujeito
vive na eterna busca de seu ser individual, ele se questiona em diversos planos,
como: no prático, no físico, no espiritual. O ser humano possui capacidade de
receber o sentido das coisas, perceber e de transformar, possui a capacidade de
construir coisas novas e a essas ‘coisas’ do mundo (sociedade) que acontecem,
formam dentro do homem, no seu psique, o que podemos chamar de
subjetividade.
O sujeito não pode estar separado da
subjetividade, do seu eu individual e de um social. Assim a coletividade da qual
participa e compartilha vem a formar a sua subjetividade, seja no trabalho, em
casa ou numa roda de amigos criando ou repetindo coisas, mas há sempre algo
diferente.
A tecnologia vem caminhado para um grande
avanço, aparecendo máquinas modernas, levando o próprio homem a uma outra forma
de criação. Hoje estamos em contato com a máquina geradora de realidade virtual,
onde o sujeito se comunica com o mundo e cria formas individuais diferentes
daquela que ele mesmo apresenta para si. Existe uma criação de uma nova
estrutura e funcionamento de nossa subjetividade.
O homem passou a manipular a ciência e a
tecnologia para buscar o seu bem-estar. Criou máquinas para ter um suporte de
conhecimento e poder, para facilitar sua vida cotidiana, mas verificamos que com
o avanço tecnológico, com a modernidade das máquinas, o homem tornou-se cada vez
mais escravo dessa tecnologia, tão avançada.
A tecnologia é um conjunto de conhecimentos
oriundos de diversas fontes científicas para a produção de bens e serviços,
visando um progresso para a sociedade. O avanço da tecnologia caracteriza um
estilo de sociedade, uma sociedade capitalista, onde esta tecnologia exprime o
conhecimento. O saber que induz ao poder.
Quando o saber induz ao poder verificamos que
a tecnologia também adquire um avanço, pois esta está associada diretamente ao
conhecimento científico. Quanto mais o homem participa do conhecimento do saber
científico, mais há um avanço tecnológico que induz ao crescimento tecnológico,
e também ao desenvolvimento da subjetividade do ser humano, pois esta permite o
aumento da criatividade do indivíduo. Podemos constatar que o conhecimento
científico é um transformador da humanidade com ela mesma e com a própria
tecnologia. A ciência é plena de sabedoria subjetiva e também é
técnica.
“Tecnologia é, pois, o conhecimento científico
transformado em técnica, que, por sua vez, irá ampliar a possibilidade de
produção de novos conhecimentos científicos. Na tecnologia está a possibilidade
da efetiva transformação do real. Ela é a afirmação prática do desejo de
controle que subjaz ao se fazer ciência e pressupõe ação, transformação; é plena
de ciência, mas é, também, técnica”. (Corrêa, 1997, p. 253)
Podemos cogitar que o modo de ser do homem, de
hoje, que vive em uma sociedade chamada cibernética, apresenta uma refração da
personalidade em vários eus.
As pessoas, neste contexto, adquirem a possibilidade de trocarem de sexo, idade,
nome, assumindo um novo papel social que não o seu, pois
“No tempo real do ciberespaço, oferecem-se ao
indivíduo mais possibilidades: a identidade torna-se fragmentada quando
convertemos o que somos de múltiplas maneiras. Como construímos e reconstruímos
o eu depende muito de crescente números de pessoas que encontramos e de como
elas nos respondem”. (Lipton, 1996, p. 343).
A tecnologia cibernética permitiu ao homem
atravessar do real para o imaginário. A subjetividade promove ao homem a
capacidade de criar e de transporta-se para além da imaginação. É como se
abrisse uma porta para o diferente, uma porta universal, invisível apenas por
meio de uma conexão. A partir dessa entrada, acontece um mundo de fantasias, o
irreal que também é real. Uma subjetividade, que talvez confusa, criada por
imagens, talvez, não existentes.
O imaginário cibernético torna-se um jogo de
mudanças de comportamento, onde o ser ‘homem’ busca um imaginário de si mesmo.
Sendo a história do homem um complexo de ordem, de desordem e de organização, o
indivíduo procura a sua satisfação, o seu prazer que, nos dias de hoje, estão
ameaçados pela desenfreada tecnologia, onde o homem vive o
trabalho.
Assim, a reação de pessoas é buscar uma saída
para extravasar esse desequilíbrio mental que ocorre dentro de uma estrutura
tecnológica exigida pela sociedade. Este indivíduo, em seus momentos vagos,
conecta com o mundo virtual e tornando-se um pouco virtual para sair desse real
as vezes sufocante.
O indivíduo é uno e múltiplo; ele é
bipolarizado, quando se refere ao yin/yang. Ele possui a incerteza e isto o leva
à dúvida (dualidade) o que lhe permite a buscar sempre o ideal levando-o à
direção do seu imaginário-criativo.
Enfim, somos seres, indivíduos, sujeitos, que
vivemos nessa realidade existente; real-virtual-imaginário. A tecnologia avança
buscando a amplitude para possibilitar ao homem o controle, o poder, o
conhecimento, o saber de todos os saberes.
A comunicação é um veículo fundamental para o
avanço de toda uma tecnologia. Hoje, a televisão, mesmo que seja uma máquina
criada há tempos atrás, ela possui uma grande influência no nosso campo de
estilo de vida, como: maneirismos, sentimentos, papéis e
pensamentos.
Este veículo de comunicação possibilita ao
sujeito a constituir outras formas diferentes de ser. A pessoa entra em contato
visual com as várias formas de experiência humana, isto permite que o homem
amplie a sua subjetividade. A televisão provocou uma desterritorialização
generalizada da subjetividade do conjunto da população.
No mundo cibernético também acontece a
comunicação. Onde a troca de informações, também visual, possibilita o
desenvolvimento da imaginação e da criação de novas formas tecnológicas para se
tentar atingir, talvez, o impossível-possível da busca da conquista do ser
humano. Com esta infinita busca, o homem está sempre na tentativa de novas
criações, de novos saberes…
Quando falamos de subjetividade, não podemos
deixar de lado o psíquico, temos que levar em consideração alguns aspectos, tais
como, um deles: a imaginação.
Na psique humana existe a capacidade de criar
uma imagem, não a partir de um choque, mas a partir de nada. A imaginação
exprime a espontaneidade representativa do ser humano. A psique humana é capaz
de ver em qualquer coisa o que não está ali. Isso torna o homem capaz de
produzir, de criar novas imagens e de reproduzi-las, pois tudo que passa por uma
mente na sua subjetividade é também vista e percebida na sua objetividade quando
se torna real, criada, produzida…
Para a subjetividade humana, o que interessa é
um sujeito diferente, tanto do sujeito inconsciente freudiano, como da definição
social. Seus traços essenciais são, por um lado, a reflexividade, a capacidade
de receber o sentido, questionar o sentido e criar um novo sentido – e, por
outro lado, a capacidade da atividade deliberada vontade.
Esta subjetividade possui a capacidade decisiva do trabalho lúcido sobre
si.
A subjetividade que leva a reflexividade
permite ao homem ser capaz de questionar seu mundo de representações e a sua
maneira de representar (de se colocar nesse mundo imaginário-real). Somos um ser
imaginante, isto é, inventores – fonte de criatividade. É preciso que possamos
imaginar algo mais do que é para ser imaginado.
Podemos construir imagens ideais e
contempla-las no imaginário, criar no virtual (não existente) e estabelecer uma
conexão com esses metapontos – real/virtual – em pensamentos simples e frágeis
que poderão desaparecer na página da virtualidade.
A subjetividade, reflexiva e também complexa,
se faz necessária para a diferenciação de um ser para o outro. É importante o
conhecimento da sua subjetividade para que se possa tomar consciência de si
mesmo e a parti de então, tomar consciência do objeto do mundo
imaginário-real.
O homem estabelece um contato virtual criando
para si um imaginário da sua própria identidade, ele cria uma nova identidade
que o leva a uma consciência de um ‘eu’ não-real para um outro ‘eu’, talvez,
não-real. Esse vínculo de não-realidade/realidade faz parte de um mundo
cibernético – imaginário-real. Assim o mundo atual vem formando uma
subjetividade além da imagem real.
“O
homem transparente fascina o imaginário moderno, que sonha com poder circular
através de tudo sem encontrar mais nenhum obstáculo, quer seja o obstáculo do
espaço, o de tempo ou o de outrem. Donde sua fascinação pela ação a distância, o
instante, a solidão. E seu desejo de ser como os fantasmas ou, melhor ainda,
como os anjos, que não encontram nenhuma barreira”… (Bertrand
Vergely – p.134 (2000).
Essa busca pela perfeição, pela tecnologia,
pelo crescimento da humanidade, induz o homem a uma capacidade de aspirar se
desrealizar e não mais ter corpo; enquanto contato, enquanto vínculo. Possui o
desejo de ter o imaginário além de si mesmo. A virtualidade permite que o homem
transpasse esse real e com esta passagem do real/irreal ele passa a surfar sobre
as ondas do imaginário. O ser transporta-se para uma subjetividade do, talvez,
nada; nem homem nem mulher; nem branco nem preto; nem velho nem jovem. Será que
o homem não encontrará mais barreiras?
O indivíduo humano constrói a sua
subjetividade, mas carrega consigo a plenitude da realidade – a existência – e,
assim, contém o todo da vida sem deixar de ser um ser único.
Maria Luiza Mohaupt