O MAIS DOLOROSO ADEUS
A partida de um ente querido para o plano espiritual é, sem nenhuma
dúvida, a maior dor que um ser humano pode sentir neste mundo. Eu já
passei várias vezes por esse momento difícil, principalmente quando
morreram meus pais e meus sogros.
Sinceramente, com todo o conhecimento espiritual acumulado que
adquiri através dos anos, pelo estudo sistematizado da nossa doutrina
consoladora, era para eu ter suportado esses golpes com menos abalo. Mas
não foi bem assim. Embora não o demonstrasse por fora, muitas lágrimas
me vazaram pelos condutos internos da alma.
Eu sei que a morte não existe. Mas saber é uma coisa e enfrentá-la em
nosso entorno, quando ocorre a ausência de um ser querido, é coisa muito
diferente. Muitas vezes me peguei falando sozinho, gesticulando no ar, e
até mesmo ouvindo a voz do ente que partiu chamando o meu nome.
Seu cheiro permanece na casa, nos móveis, nas roupas que usava, em
toda parte. A gente olha aqueles sapatos descansando num canto e parece
que o dono logo virá apanhá-los. Sua imagem continua viva em nosso
inconsciente, e quando um carro vira a esquina e um lampejo de seu farol
se projeta no interior da casa, é como se a pessoa querida estivesse
chegando.
Procurava orar, e a oração é um socorro maravilhoso, um bálsamo que
suaviza muito o nosso sofrimento, mas leva tempo para a ferida cicatrizar.
O problema é que se a cura é o esquecimento, eu não queria esquecer. Essa
é uma ideia que nem passava pelo meu pensamento.
Eu me apegava muito a Deus e à fé, e essa foi a minha tábua de
salvação. Aqueles diálogos silenciosos com o Pai Celestial em minhas
preces, rogando-Lhe que acolhesse em Seu seio amoroso aquela pessoa
amada que partia, foram me restituindo o equilíbrio e eu comecei a retornar
serenamente para a realidade que me envolvia.
Uma pessoa nos deixou, mas a vida não morreu. A vida continuava
presente em nosso dia a dia, exigindo atenção e nos preparando para a nova
realidade. As pessoas que ficaram – os familiares, os parentes, os amigos,
os companheiros – também contavam com o nosso reequilíbrio e a nossa
participação. Os adultos esperavam nossa volta à vida normal. As crianças
aguardavam nosso sorriso de cumplicidade.
Não temos o direito de amargurar a vida dos outros com a nossa
angústia. Não temos o direito de tirar a alegria dos outros com a nossa
tristeza. O luto da alma é inevitável por alguns dias, mas ele tem que ir se
esvanecendo e clareando com o escoar das horas.
Por tudo que já havia lido sobre o assunto eu pensei que saberia
enfrentar com destemor a hora borrascosa quando ela chegasse. E,
realmente, meu conhecimento da realidade espiritual me ajudou muito na
hora do sofrimento. Mas não foi um salvo-conduto que me livrasse dos
solavancos da passagem.
Busquei arrimo no Evangelho, na palavra do Cristo e dos mentores
espirituais. Fortaleceu-me bastante a mensagem do Apocalipse, onde Jesus
fala da chegada do novo Céu e da nova Terra, quando então não haverá
mais morte, nem luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas
passaram. E o divino Mestre enxugará de nossos olhos todas as lágrimas.
Isto foi como se mãos de anjos algodoassem meu coração.
Voltando a meus familiares, minha mãe foi a primeira a partir. Foi uma
surpresa para todos nós porque ela aparentava estar muito bem de saúde.
Mas um colapso a levou de repente e nós ficamos fora do ar, como se o
chão se fluidificasse sob nossos pés.
Meu pai, porém, foi um desenlace mais ou menos esperado porque já
estava bem avançado em anos e, além disso, se encontrava adoentado no
leito, recebendo cuidados médicos. Fiz uma prece pública, no velório de
ambos, para confortar a mim mesmo, a meus familiares, aos amigos
presentes e, principalmente, às almas dos que partiam, que nessas horas
precisam ser envolvidas em eflúvios suavizantes de paz.
No caso de meu pai, enquanto o cortejo acompanhava o féretro ao
campo santo para o derradeiro adeus, eu acompanhava seu espírito em
pensamento e o imaginava despertando meio sonolento no mundo espiritual
e se perguntando: A quem devo me dirigir agora? E eu lhe respondia, num
sussurro de prece: a Deus.
Assim, descobri que existem dois tipos de despedida: adeus e a Deus.
Muitos participam do primeiro tipo. Poucos participam do segundo. Eu
participei de ambos na despedida de meu pai. E fiquei muito feliz.
Mário Frigéri é autor da Mundo Maior. Pulicou os livros: 100 Poemas que Amei e Brasil de Amanhã- O Futuro do Brasil á Luz das Profecias.
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